A primeira referência que Martin Romaña chama à leitura é a do Quixote, mas Pio Baroja e o grande Hemingway também fazem parte das obsessões do peruano que abandona as posses da família e parte atrás de um sonho. Hemingway é, aliás, o responsável pela viagem, já que Romaña pretende chegar a Paris, ser feliz com a bela Inês e ser escritor, com a certeza de passar exactamente pelas mesmas experiências (amorosas e literárias) que o autor americano ali terá vivido. Claro, a realidade estará longe disso, até porque estamos a chegar ao agitado Maio de 68, e há Inês, e Marx, e o Grupo, e os amigos que vêm e vão.
Assim, uma boa parte da construção desta Vida Exagerada... passa pelo constante choque entre o que Martin imaginou e aquilo que lhe sucede, com clara desvantagem para a estabilidade que procurava e com imensa vantagem para os leitores, privilegiados pelo acesso a um humor quase impertinente e às manobras de uma ironia sem par. Quanto ao Quixote, não há melhor espelho para Martin Romaña, narrador de façanhas que quase sempre ficam sem prova, não porque não exista, mas antes porque a desgraçada sucessão dos acontecimentos a fez desaparecer irremediavelmente, deixando o narrador afogado em desespero e o leitor sem testemunho possível, mas verdadeiramente afortunado pela leitura de tanto exagero.