Monólogo contínuo, esse texto de Thomas Bernhard não pertence ao ciclo de suas narrativas autobiográficas, embora se aproxime delas ao revelar o autor, internado para cuidar dos pulmões, às voltas com um homem a um tempo original e patético: Paul Wittgenstein, sobrinho do genial filósofo, mas em tudo diferente do tio que celebrizou o nome.
O Sobrinho de Wittgenstein parte de uma alusão a O sobrinho de Rameau escrito no século XVIII por Diderot, para descortinar a vida de um homem incapaz de realizar uma obra, pois desperdiça seus talentos no prazer do instante. Ao observar Paul, Bernhard reencontra o veio de sua vocação para o banal e o profundo, os pequenos risos e choros do cotidiano, a convivência nos cafés vienenses, a fatuidade dos prêmios literários. Tudo embutido nos solilóquios alucinados, repetitivos e cruéis que lhe eram tão característicos. Instigante como tudo que Bernhard realizou, este livro fala de amizade num texto que sabe acompanhar, no movimento formal, o declínio de seu anti-herói. Uma realização que surpreende ao conciliar técnica e pungência.