O teatro é uma bela maneira de fazer cultura científica, uma bela maneira de, através da arte, levar a ciência - neste caso, a história da ciência - ao grande público, mostrando quais são e como são os seus processos e caminhos. Se Darwin é hoje um nome bem divulgado, Francisco de Arruda Furtado não será ainda suficientemente conhecido dos portugueses. Ele, que foi uma excepção à regra do atraso científico, merece sê-lo, em particular dos jovens interessados pela ciência. Tal como ele, embora longe da ciência, quem for suficientemente curioso, esteja onde estiver, poderá aproximar-se dela, pois tem-na ao seu alcance. Como a peça sugere, basta ser curioso. E pode sempre haver um sábio contemporâneo que lhe responda...»
in «Prefácio»
Esta obra, em forma de peça de teatro - que se quer lida e se exige representada em palco -, em boa hora escrita por um divulgador de ciência, não por acaso geólogo e Doutor em Paleobiologia, coloca a cultura científica no palco, o que só pode ser positivo. Através dela podemos ver quem foi Charles Darwin. Geólogo? Biólogo? E também ter uma ideia sobre o impacto que as ideias de Darwin tiveram no Portugal do século XIX. Na comunidade científica de então, produziu-se uma tese de doutoramento, pelo ilustre biólogo e botânico Júlio Henriques, por muitos e longos anos voz científica quase única, o que convenhamos é muito fraco pecúlio para tanto potencial argumentativo, para tal revolução estruturante do pensamento biológico e, por que não, filosófico. No entanto, anos antes de Júlio Henriques e num contexto informal, houve um português, amanuense de profissão, curioso, observador e estudioso atento de coisas da Natureza, de seu nome Francisco de Arruda Furtado, que se correspondeu com Darwin. Pelo que sabemos dos escritos de Darwin, cujas cartas com Arruda Furtado são aqui traduzidas e apresentadas, foi o único português com que trocou correspondência. Sabendo-se que Darwin fazia questão de sempre responder a cada carta que recebia, esta pode ser uma medida do acolhimento das ideias de Darwin no Portugal do séc. XIX.
AMADEU SOARES,
Prof. Catedrático, Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro