"Se a civilização é autocontrolo, orgia é a festa ao contrário, a festa do excesso, a euforia sem limite protocolar. Bem, existem orgias e orgias - e é desses vários patamares de prazer e tentações que Luis Fernando Verissimo fala neste livro. As traições amorosas podem provocar orgias discretas, em dia de semana à tarde, ninguém ficará a saber além dos dois, ou três, ou quatro, ou quantos forem os participantes dos jogos de amor. Vale tudo, nessa orgia; aliás, a boa orgia deve ser sinónimo de anarquia, de entrega total às tentações e aos instintos. A chegada do reveillon e a sucessão de festas de fim de ano são orgiásticas, a seu modo, quando revertem a posição que normalmente todos ocupam, nos escritórios, para se encenarem como festas em que é preciso desreprimir, festejar, de igual para igual, o ano que se foi e o que virá - quando evidentemente seremos melhores, marcaremos a ida ao dentista e deixaremos de fumar. Enquanto isso, a festa pré-final de ano ganha o seu carácter libertário e, às vezes, libertino também. Bebida, dança, comida - com fartura. Acontece assim também no Carnaval, em que a troca do dia pela noite é apenas um indício a mais de uma certa loucura colectiva, uma inversão de papéis e sinais. Neste caso, mesmo que não esteja na orgia da avenida, desfilando com os peitos nus, todas as imagens do samba e da festa vão assaltá-lo - e ninguém é assaltado impunemente. Os anjos da nossa vida, as nossas queridas crianças, sabem, e como, fazer uma bela orgia - experimente deixá-las à vontade numa festa de aniversário, e neste cenário podem parecer-se até com os tais anões besuntados que Verissimo aposta terem sido obrigatórios nas primeiras orgias romanas. As gregas eram em homenagem ao deus Dionísio, e também se caracterizavam pela perda generalizada de controlo."