Maynard desfaz mitos com o mesmo escrúpulo com que dispara.
Matt West
Este Matt West nunca existiu. É apenas mais uma das invenções de Dinis Machado para ajudar a vender o cámone, e seu irmão gémeo, Dennis McShade. Contudo, e apesar desta credibilidade acrescida de um suposto crítico estrangeiro, a censura estranhou o assunto e a linguagem deste Mulher e Arma Com Guitarra Espanhola. E foi preciso convencer, com um fabuloso passe de peito, o senhor Major da Censura Prévia que este era o último livro que tinham traduzido de um incomum autor americano de policiais de bolso. Aquele, parecendo levar à letra o culto sistemático do absurdo de que fala Dinis Machado na nota de editor introdutória, acreditou nesta improvisada patranha e o livro lá saiu sem rasuras nem cortes.
Passava-se isto em 1968 e Dinis Machado, então director da colecção Rififi, não se coibiu de teorizar, na tal nota de editor – não falso, mas neste caso em causa própria – sobre este grande género menor que é o policial negro:
As mortas e respeitáveis receitas são isso mesmo: mortas e estimáveis.
Como se, inconsciente mas muito determinado, Dinis Machado soubesse que, se os dois primeiros eram o prelúdio do monumental O Que Diz Molero, este Mulher e Arma Com Guitarra Espanhola seria a preparação para o seu ainda inédito testamento literário – o perturbante e visceral Blackpot. Pequeno grande livro do grande Dennis McShade que a Assírio & Alvim em breve publicará. Para gaúdio dos grandes leitores de todas as literaturas menores.
«(...) tudo escurecia dentro de mim, as palavras eram escuras, havia um movimento de escuridão à minha volta, e depois pensei na palavra poço, e já não havia água nesta palavra, e as bolas de bilhar pararam dentro de mim, e já não havia sangue nem som, apenas a parede que se aproximava, que crescia sobre mim. A minha nuca escureceu e fui engolido pela parede.»
(Dos pesadelos maynardianos)