«Pessoa não concebeu um, mas uma pluralidade de livros. Atribuídos a diferentes nomes de autor e obedecendo a um mesmo desejo de totalidade, estes livros eram definidos enquanto expressão de concepções específicas e diferentes entre si e que, no seu conjunto, deveriam realizar o desejo de expressão total da experiência. […] O pensamento editorial de Pessoa, que tem como horizonte a publicação da obra em livro, é determinante na criação de autores e editores ficcionais para as obras a publicar. Ao inserir a própria organização editorial dos textos no plano da ficção, Pessoa cria esse sistema que tudo alberga e onde são reconhecíveis traços estruturais constantes. Entre estes traços encontram-se a dita criação de autores e editores ficcionais para obras cuja publicação é projectada, a divisão da obra em duas metades, distinguindo mas integrando o nome próprio num mesmo conjunto, ou o adiamento de um estádio definitivo da obra, publicada ou não, o que acaba por funcionar também como garante da sua posteridade.»