Naquela manhã de 22 de Janeiro de 1961, os passageiros do paquete de luxo Santa Maria Aperceberam-se de que algo estava errado. Havia marcas de sangue no chão. Um homem armado impedia-lhes o acesso ao convés superior. Na sala do pequeno-almoço, não havia o habitual menu para a escolha dos pratos. Os empregados, com ar tenso, fazem correr a notícia, em voz baixa: «Uns rebeldes tomaram conta do navio.» A liderá-los está o capitão Henrique Galvão, o inimigo número um de António de Oliveira Salazar. Fervoroso salazarista, Henrique Galvão começa a desiludir-se e a afastar-se dos ideais defendidos pelo Estado Novo em 1949 quando afronta o regime na Assembleia Nacional, onde denuncia a escravatura e vários negócios promíscuos que envolvem a Administração de Angola. Estava aberta a porta para o confronto entre os dois homens que se conheciam bem. Seguiu-se uma tentativa falhada de atentar contra a vida do presidente do Conselho, em 1951, a prisão, uma espectacular fuga do Hospital de Santa Maria e o exílio. Salazar terá desabafado na altura: «Vamos arrepender-nos mil vezes. É muito mais perigoso que (Humberto) Delgado.» Salazar não estava enganado. Galvão escreve uma violenta carta aberta a Salazar, prepara a «Operação Dulcineia», que durante largos dias ocupa páginas e páginas da imprensa internacional. O regime ficava exposto. O exílio no Brasil não trava o seu ímpeto de lutador anti-fascista. Segue-se o sequestro de um avião da TAP e o depoimento contra Portugal na sede das Nações Unidas, arriscando-se a ser preso e extraditado para Portugal.