Sossegar não é descansar - não é uma consequência do cansaço.
Quando Rebelo da Silva, citado por Moraes, que por sua vez cita o dicionário de Freire, diz "O coração não sossega, a vida cansa", ambas as coisas são verdadeiras, mas a associação é enganadora, porque o coração não sossega por causa de a vida cansar.
Há cansaços bons. Não. O coração não sossega, porque não tem com que sossegar.
Quando aparece um amigo sem avisar, interropendo tudo o que se tencionava fazer, sossega-se.
Quando se está alutar contra a injustiça e a maldade, com todas as forças que se tem, sossega-se.
Quando se acredita em Deus. Isso, sim, é sossegar.
Gosto de sossegar como verbo transitivo. Sossegar só por si não chega.
É mais bonito sossegar alguém.
Quando se pede "Sossega o meu coração" e se consegue sossegar.
Quando se sai, quando se faz um esforço para sossegar alguém.
E não é adormecendo ou tranquilizando, em jeito de médico a dar um sedativo, que se sossega uma pessoa.
É enchendo-lhe a alma de amor, confiança, alegria, esperança e tudo o mais que é o presente a tornar-se, de repente, futuro.
É o futuro que sossega. "Amanhã vamos passear" sossega mais do que "Não te preocupes" ou "Deixa lá, que eu trato disso".