Pensar a literatura da guerra colonial é um modo, talvez oblíquo, de a reler, porque nela se insinuam, encobertos ou recalcados, rastos de um passado que ainda foge à fundação de uma memória compartilhada. A experiência incómoda da guerra colonial, de facto, proporciona material teórico e imagético relevante para uma possível genealogia da identificação de uma nação e de um império estilhaçados, suspensos entre a perda impreenchível de marcas de auto-reconhecimento e a vertigem de uma possível palingenesia total. Um corpus textual da literatura da guerra, seleccionado através de uma problematização de ordem canónica, é repensado a partir de alguns paradigmas críticos melancólico, testemunhal, residual, trágico-moderno, traumático, biopolítico, etc. – que procuram, na sua precariedade, localizar – mais do que preencher – faltas e perdas de conhecimento. Em jogo, o limiar trágico e esfarrapado de uma tensão ainda em curso entre o colonialismo e o que se seguiu, depois e além dele. A excepção que a guerra permite pensar em múltiplos sentidos, mas sobretudo a partir de uma desmontagem enquanto categoria da filosofia política, contribui para elaborar, através da própria reconfiguração paradigmática praticada no livro, uma crítica directa ao excepcionalismo atlântico da revisão luso-tropicalista do império que se desfez. O que sempre falta é pensar Portugal.