"Durante os primeiros dois anos de matrimónio as relações com minha mulher foram - hoje posso afirmá-lo - perfeitas.
Quero dizer que naqueles dois anos o acordo dos sentidos, completo e profundo, era acompanhado por aquela obnubilação ou, se se prefere, por aquela inércia da mente que em semelhantes circunstâncias paralisa todas as faculdades de apreciação e provoca a admiração exclusiva da pessoa amada.
Nesta história quero contar como, enquanto eu continuava a amá-la e a não a julgar, Emília, pelo contrário, descobriu, ou pensou descobrir, alguns defeitos em mim, julgou-me e por consequência deixou de amar-me."
Conforme explica o prefaciador da presente edição, Pedro Moura de Sá, O Desprezo é, antes de mais, a história da despoetização de uma relação amorosa.
Pouco a pouco, num casamento que parecia perfeito, entre um casal que tudo parecia unir, o olhar crítico introduz uma distância que é irremediável e que cedo se degrada em desprezo, essa espécie de ácido corrosivo capaz de destruir o mais profundo amor.
Situado em Roma e na ilha de Capri, este romance de Moravia, seguramente uma das obras míticas da literatura italiana do pós-guerra, é um prodígio de evocação de ambientes e paisagens.
A contradição entre a experiência, cada vez mais sombria, das suas personagens principais e a luminosidade sem mácula dos seus cenários é uma das características inesquecíveis deste clássico da literatura universal do século XX.