Deixem-me cá falar-lhes dos cães.
Era um desses dias de 40 graus à sombra e lá andava eu. A suar, maldisposto, a delirar, ressecado.
Parei num prediozinho de apartamentos que tinha a caixa do correio cá em baixo, ao longo do passeio.
Abri-a com a minha chave.
Não se ouvia um pio.
Até que senti qualquer coisa e enfiar-se pelo meio das pernas.
Foi por ali acima.
Olhei e vi um pastor alemão adulto com o focinho já meio enfiado no meu rabo.
Resolvi que aquela gente não ia receber o correio nesse dia, e se calhar nunca mais.
Chiça, ele estava mesmo com o nariz lá metido.
Snuf! Snuf! Snuf!
Pus o correio outra vez no saco de cabedal, e depois muito, muito devagar, dei meio passo em frente.
O focinho seguiu-me.
Dei mais meio passo com o outro pé.
O focinho seguiu-me.
Então, devagar, muito devagar, dei um passo completo.
Depois outro.
Fiquei quieto.
Já não tinha o focinho.
E ele ali especado a olhar para mim.
Se calhar, nunca tinha cheirado nada assim e não sabia bem o que havia de fazer.
Fui-me embora devagar.