«Vivendo e trabalhando em Inglaterra, onde se instalou definitivamente desde 1976, Paula Rego continua a elaborar as questões da formação da identidade em torno do país onde nasceu, inquirindo o modo como a cultura visual que moldou a sua infância em Portugal poderá hoje ressoar junto de um público internacional mais vasto; como uma expressão na língua portuguesa pode ser encenada como imagem; como a articulação da «Portugalidade» pode ser constituída visualmente. Mas é sobretudo nas alusões ao Estado Novo que Rego evoca a Portugalidade com maior consistência: evoca-a enquanto passado e enquanto traço mnemónico. Pois o passado não é apenas um fardo que se carrega no presente: poderia dizer-se que a própria existência dele se extrai da visão imediata.
Isso tem ressonâncias num campo aparentemente muito distante do histórico: o da psicanálise. Lá onde a repetição traz à luz algo que está oculto mas não inteiramente esquecido, Rego invoca as imbricadas cronologias que informam o encontro entre o analista e o analisando na cena psicanalítica. Ao desdobrarem-se, tais narrativas trazem à luz uma anterioridade imersa em imediatez, onde a acção corrente substitui uma memória recalcada: faço isto em vez de recordar aquilo. Na base deste livro está pois o encontro entre duas disciplinas aparentemente díspares: a história e a psicanálise.» Ruth Rosengarten, da Introdução