Para Alain Badiou o nosso tempo é sem dúvida o do desaparecimento, sem regresso, dos deuses. Contudo este desaparecimento resulta de três processos diferentes, visto que houve três grandes deuses: o das religiões, o da metafísica e o dos poetas. Do Deus das religiões há somente que declarar a morte. O problema, que em última instância é político, é defender-se dos desastrosos efeitos que qualquer obscura subjectivação desta morte acarreta. A parada está toda no despegar a política dos arcanos do poder do Estado e na sua restituição sequencial ao subjectivo puro da prescrição. Porque, desde logo, a autoridade espectral do Deus morto, que pode sempre ligar-se a andrajos de superego do Estado, permanece nas consciências sem influência e sem efeito. Do Deus da Metafísica, há que acabar o percurso com uma ideia do infinito que lhe dissemina o recurso por toda a extensão das multiplicidades comuns. Do Deus da poesia, é necessário que o poema desobstrua a língua, estabelecendo nela uma cesura no dispositivo da perda e do regresso. Porque não perdemos nada e nada está de volta. A probabilidade de uma verdade é suplementação e, então, algo sucede. Não obstante, sucede aqui sem profundidade e sem outro lugar. Entrados na tripla destituição dos deuses, já podemos dizer, nós, habitantes da infinita residência da Terra, que está cá tudo, ainda cá está, e que o recurso do pensamento está no aborrecimento igualitário firmemente prevenido, firmemente declarado, do que aqui nos acontece.