Prémio Literário João Gaspar Simões 2015
Neste romance a duas vozes – a do gandarês que trocou a enxada, com que se estreara na Ribeira do Sado, pela mala verde de folha de Flandres e a da alentejana que largou a foice e se fez professora primária – se cruzam vidas e se aproximam geografias distintas.
«A minha Gândara, avara ao negar a côdea a muitos dos seus naturais, obrigava-os a esgaravatá-la longe. Para o sul do Tejo atirou os ti-belarminos e os manéis-ourives. Eu fui ambos: fui o Galego, o Ratinho ou o Caramelo que se vergou à enxada e à foice e fui o ourives ambulante que palmilhou cada vereda, cada barranco, cada cabeço, cada moiteira, cada pastagem onde um chocalho anunciava um moiral, um cabreiro, um ovelheiro. Olhei o meu fato, coçado mas razoavelmente limpo, olhei a minha bicicleta cujos pedais me ofereciam uma liberdade de pão incerto, olhei os caules que apodreciam nas marachas das quais se erguia uma prisão de pão certo, embora escasso, e vi os dois destinos do gandarês.»