Albertine, a pequena santa dos escritores inconformistas. Rapidamente me vi arrastada para o seu mundo – disposta a garatujar pela noite fora, engolindo cafeteiras de café quente e detendo-me só o tempo suficiente para retocar os olhos com Maybelline. O seu mantra juvenil foi aceite de alma e coração, impregnando o meu espírito maleável.
Patti Smith
Livro de culto de um fulgurante cometa no universo literário francês, O Astrágalo (1965) narra a fuga permanente da jovem Anne depois de saltar os muros da prisão e, na queda, fracturar o osso do pé, cujo nome dá título a esta obra. Entre esconderijos e armadilhas, ergue-se dos escombros um ser rebelde e impetuoso, confrontado com a vertigem da liberdade e a paixão arrebatadora que a prende a Julien, o seu salvador. A sua voz autêntica revela-nos uma existência marginal, à mercê da bondade de estranhos, que, depois da reclusão forçada, se confronta com as prisões mais subtis da vida quotidiana. Pelas suas linhas manchadas de nicotina e de ânsia de viver, que fundem a exuberância juvenil e os bas-fonds de Paris e da alma, é um dos derradeiros livros-talismã de leitores insubmissos.
Alma gémea de Jean Genet e «pequena santa dos escritores inconformistas», Albertine Sarrazin (1937-1967) teve uma vida tão breve quanto trágica. Abandonada em tenra idade na sua Argélia natal, conheceu um lar adoptivo e instituições, tendo abraçado, esporadicamente, o crime e a prostituição e, persistentemente, a rebeldia e a insubmissão. Presa por furto em Paris, em 1957 saltará o muro da prisão e fracturará o astrágalo. A sua mente brilhante, alimentada a versos de Rimbaud, dar-nos-ia três romances: O Astrágalo e La Cavale (ambos de 1965), escritos atrás das grades, e La Traversière (1966). Conhecerá o amor ao lado de Julien Sarrazin, também ele um ex-condenado, e um fugaz, mas estrondoso, êxito. Foi «a primeira mulher a falar das suas prisões», segundo Simone de Beauvoir, e, pela elegância poética das suas páginas, denunciou como ninguém as prisões que nos enredam os dias.