Trabalhando como quem trabalha, Mário estava sentado num banco amarelo de cozinha a fazer horas. Estas iam caindo a seu lado, fazendo um tilintar estranho ao baterem o chão de várias cores. Quando alguma caía um mosaico mais duro, partia-se, e passava a valer apenas um quarto de hora, o que muito aborrecia Mário que estava com pressa. Olhou para a janela - acabara de colocar a véspera vidros martelados à mão para que os corvos que passavam não lhe viessem roubar as horas que brilhavam no chão (Mário ganhava à hora) -, levantou-se, abriu-a de par em par, apesar de só ter uma, e olhou para o rio que se espraiava logo ali. Desde há já bastantes anos que os mais endinheirados se tinham mudado para longe por causa dos vapores que, dizia-se, matavam em cerca de dez anos.